segunda-feira, 5 de novembro de 2012

O Preço da Traição por Claudio Russo

O Preço da Traição

Cláudio Russo | Claudio Russo | 23/10/2012 14h28
Ela estava errada e eu também... Eu não, de certo não! E vi que a tristeza pode ser bonita, uma beleza diferente, algo que beira o drama, comovente e afiada como a lâmina de um punhal... Daquele momento em diante a música ganhou forma apoteótica e eu... eu senti bastante ódio de mim mesmo... E cheguei a conclusão que estava pagando com a mesma moeda o preço da traição...
Você sabe qual é o preço da traição? Quanto custa... quanto vale? Posso dizer que meu coração por diversas vezes me traiu, em alguns momentos parece que não chegamos ao acordo e é só ouvir acordes dolentes, geralmente em tom menor, que o meu amigo do lado esquerdo do peito se envolve sem me dizer nada.
Digna dos maiores casos passionais a canção "O Preço da Traição", de Silvestre David da Silva, envolve não pela separação como motivo, e sim, pelas consequências dos deslizes mútuos de um casal. Como seria ver seu amor com a outra ou o outro e você pobre coitado, ou não, nos braços de outro ou outra também. Eu não tinha o direito de lhe chamar atenção...
Ah Cabana!!! tanto ouvi falar ao seu respeito, tanta coisa que nem sei... ao som de Martinho, Clara, Beth e muita gente bamba, a nossa gente do samba, ouvi seu talento. Garçom põe a bebida na mesa, eu pago toda despesa, não cobre nada a ninguém... Um dia li que figuras como um dos fundadores de nossa escola e li também que a ida de Neguinho para Nilópolis foi indicação sua. Longe, muito cedo, você escutou o talento daquele que se tornou um dos maiores cantores de samba deste País: Olha a Beija Flor aí gente...
apesar de não ter tido o prazer de conhecê-lo, posto que nos deixaste muito antes de me ver como um compositor, acho que guardando as devidas proporções e evitando comparações o que não é minha pretensão, visto que o prejuízo será meu e a balança tenderia muito a seu favor, temos pelo menos alguma coisa em comum meu poeta. Nós dois habitamos o mesmo espaço, em épocas diferentes sim, mais empunhamos as mesmas bandeiras.
Ilu Ayê, Terra da vida, parceria sua com outro grande compositor: Norival Reis, talvez seja seu maior sucesso, o grande samba da Portela de forma alguma tira o brilho de um pequeno pássaro e a sua cumplicidade com a princesa nilopolitana. Á esta gente que tão bem conheceu, a este povo sambista da maravilhosa e soberana digo: Como é para o bem de todos e felicidade geral da nação, diga ao povo que fico... ao seu lado para sempre ao som desta bateria, ao som desta comunidade que impõe respeito...
Deve fazer quase trinta anos que a ouvi pela primeira vez, foi um tio, muito próximo, em um desses pagodes da vida que puxou O Preço da Traição e depois povoaram a minha memória gravações do Zé Ferreira, O Negro rei da Vila, a mais bonita versão, Bezerra da Silva, Zuzuca e agora há bem pouco tempo, uma gravação fresquinha com o excelente grupo de samba do amigo Leleco, o Samba pra gente.
A pergunta continua... e parece muito intrigante, original, pra não dizer genial terminar a música com um questionamento ao invés de um tradicional desfecho. Salve Cabana, um dos maiores compositores do samba verdadeiro, poeta da Beija Flor, campeão na Portela, que nos deixou quase que profeticamente um ensinamento: Aqui na terra se faz, aqui mesmo se paga, Aqui a gente pragueja e sofre também os efeitos da praga, estou confuso sem saber qual atitude vou tomar: o que faria você em meu lugar?

Fonte: www.sidneyrezende.com